COVID-19 e a tsunami de dados

Muita gente inteligente repete como um mantra a seguinte frase: “dado gera informação e informação gera conhecimento”. Mas, poucos se perguntam uma coisa muito importante: qual a origem deste dado que principia a tão repetida sequência de fatores que levaria ao conhecimento?

O dado não é algo “dado”, que está pronto na natureza e basta magicamente ser colhido para que informações sejam extraídas dele. Seja através de pesquisas, análises, softwares, fórmulas matemáticas, observações… todo dado é construído, independente da metodologia adotada para sua confecção.

Isto significa então que não podemos confiar nos dados? Claro que não! Mas significa que precisamos entender o processo de construção dos dados que utilizaremos. Se “dados geram informações” e “informações geram conhecimentos”, podemos afirmar também que “conhecimentos geram dados”, e os detentores deste conhecimento sobre a criação dos dados estarão sempre um passo à frente dos que utilizam os mesmo dados sem conhecer sua história.

Não digo aqui que um profissional que for utilizar ciência de dados em seu trabalho precisa entender todos os detalhes de cada metodologia de pesquisa, software ou fórmula estatística utilizada no processo de construção de seus dados, mas é imprescindível que ele entenda de forma macro quais as escolhas feitas por sua equipe de pesquisadores, programadores e/ou softwares, e seja capaz de debater com eles mudanças de abordagem para a criação de dados mais eficientes para contar a história que deseja.

Assim, entendendo os dados como elementos construídos deliberadamente, que carregam em si escolhas e recortes feitos a priori, o profissional deixa de ser presa fácil para contra argumentações “baseadas em dados”. Inclusive, passa a ter elementos para se defender de antagonistas que tentem fazer seus dados “confessarem” algo que eles não foram criados para dizer.

Um exemplo que todo mundo está acompanhando agora é a evolução dos casos de COVID-19 pelo mundo. A todo momento vemos na TV e nas redes sociais gráficos sobre a evolução diária dos casos de contaminação ao redor do mundo e comparativos de sua letalidade em cada país. Mas, não vejo ninguém comentando sobre qual o caminho percorrido por esses dados, e fico com várias perguntas na cabeça sobre a história por trás destes dados

Como cada país reporta seus casos de contaminação? Aqui no Brasil, por exemplo, o sistema de saúde é descentralizado, e unidades de atendimento nas pontas enviam relatórios periódicos ao Ministério da Saúde, que não tem informações ao vivo do que está acontecendo. 

Quem está sendo testado? A diferença de espaço amostral muda totalmente uma análise estatística. Se um país só testa quem chegou doente no hospital e o outro está testando o máximo de pessoas possível, esses resultados podem ser comparados?

Ainda sobre o recorte amostral da população: todos os países estão testando seus mortos? Qual a chance de em um local pessoas estarem sendo enterradas sem nunca sabermos que estavam contaminadas, enquanto em outro lugar, que testa todas as pessoas, essas mortes serem contabilizadas?

E sobre mortos; como é decretado que alguém morreu por conta da COVID-19? Pacientes que já estavam internados com uma doença terminal e tiveram o vírus encontrado em seu sangue contam? E pessoas contaminadas que tiveram complicações generalizadas? E as pessoas com outras doenças, com alta possibilidade de cura em situações normais, que não conseguiram leitos em UTI pois todos estavam ocupados com enfermos da COVID-19, também são contabilizados como vítimas do SARS-CoV-2?

Como os testes são feitos? Existem diferentes metodologias e equipamentos para testar a presença do SARS-CoV-2 em uma pessoa, e novas formas estão sendo criadas enquanto a pandemia evolui. Os resultados serão sempre os mesmos para casos idênticos testados de forma diferente? 

Como estão sendo tratados os resultados leves? Resultados de exames de presença de um vírus no sangue não são binários. A resposta “está contaminado” ou “não está contaminado” é dada usando qual recorte de presença do agente virótico no organismo? Todos os países estão usando o mesmo critério?

E para todas essas perguntas ainda vale outro questionamento: os países estão mantendo internamente a mesma metodologia ao longo do tempo ou estão a alterando? Se um país passa a testar mais pessoas e a curva de infectados sobe, isso significa que mais pessoas se contaminaram ou que antes elas simplesmente não haviam sido aferidas?

Com todas essas reflexões não quero de forma nenhuma dizer que os dados sobre a COVID-19 são falsos, e que você não deveria confirmar neles. Afirmo sim que esses dados (assim como todos os dados do mundo) carregam consigo subjetividades originadas nas escolhas que necessariamente são feitas para a construção de um dado.

Então, o que fazer na prática? Sabendo que o dado não é uma dádiva, encontrada pura e neutra na natureza pronta para ser utilizada, se você quiser se aprofundar em um assunto e entender como uma tese está sendo construída e sustentada por números, não poderá simplesmente confiar nos dados apresentados por seus antagonistas, e necessariamente precisará compreender a origem e a confecção dos dados que estiverem sendo apresentados. Assim, sabendo quais histórias eles contam, você terá elementos para refutar conclusões que estejam sendo feitas a partir destes dados e, eventualmente, criar novos dados que revelem novos fatos sobre o mesmo caso.

Complexo esse assunto, né? Por isso que criamos um curso inteiro de “Mergulho em Ciência de Dados” no Programa Direito Inovador. Cadastre-se agora gratuitamente e tenha acesso hoje mesmo às primeiras aulas!

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Programa de Imersão em Direito Inovador

Com prazer anuncio que farei parte da coordenação do Programa de Imersão em Direito Inovador, uma série de cursos a distância criados por profissionais de pelo menos 8 diferentes ramos do conhecimento que, juntos, e depois de anos de estrada no front de combate do dia a dia, decidiram criar um caminho mais assertivo, concreto e acessível para construir e compartilhar conhecimentos multidisciplinares nas áreas do Direito, de Ciência de Dados, Design, Analytics, Jurimetria, Gestão, Tecnologia e Pesquisa.

A primeira versão do site já está no ar com detalhes sobre nossos três primeiros cursos: “Direito Digital” e “Mergulho na Ciência de Dados” e “Narrativa, Visual Law & Legal Design”.

Acesse agora e inscreva-se gratuitamente para ter acesso em primeira mão às aulas inaugurais!

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Manual de alforria pessoal

Na cabeça o sucesso de hoje é um tapa na cara do eu de ontem. Conseguir fazer agora dói, pois mostra que era capaz e poderia ter feito antes. Nessa lógica, a melhor forma de se sentir menos mal com os fracassos de outrora é não obter sucesso hoje. Assim, a culpa deve ser do sistema, do universo, de ter se engajado em algo que é para si. Qualquer coisa pode ser culpada, menos suas escolhas.


Com isto se coloca em um lugar mental em que o fracasso é mais confortável que o sucesso, e se blinda do chicote do passado com o chicote do presente, que tem o peso de um momento e não de muitos anos. Quando se ver neste local é preciso prestar atenção em como o corpo reage, e aceitar que a mente tem esses gatilhos. Que do jeito dela tenta proteger. E é exatamente neste momento que é preciso ser lúcido, e lembrar que infinitos chicotes no presente doem mais que um pesado chicote do passado. E mais. Um segundo após uma nova chicotada masoquista do presente ela se soma ao chicote passado, que a cada momento fica mais grosso e mais pesado.


Quando lucidamente se ver nesta situação deve-se mentalizar o chicote futuro, e lembrar que este sim é o mais pesado de todos. A certeza da chicotada futura é o estado mental mais angustiante e imobilizante, a do passado é letra morta e a do presente é a que deve ser encarada. Em nome de um futuro sem chicotes é preciso aceitar as chicotadas do passado, e pensar na doce liberdade que somente existirá se conseguir domar o chicote presente.

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A distância

Ah, a distância! O que tem de amendrontadora tem de poderosa. Como tudo parece tão duro, firme e imutável sem ela.


Se ter uma rotina faz bem ao homem, sair dela é o supra-sumo da benfeitoria. Imersos na rotina temos o olhar míope da formiga, que consegue ver cada detalhe, e trabalhamos mentalmente todos eles. Como uma boa formiga em cima de uma mesa, analisaremos todos os grãos de açúcar ali abandonados e bolaremos as melhores estratégias para nos alimentarmos deles.


Mas então a distância nos permite o olhar amplo da águia. O olhar que não consegue reparar quantos grãos de açúcar existem na mesa, e nem bolar estratégias para transportá-los e protegê-los. Mas é esse olhar que permite ver que existem vários outros alimentos além da mesa, e que toda a logística e complexidade dos grãos de açúcar da mesa talvez não sejam tão importantes assim.  De cima se vê que existem várias mesas, prateleiras, potes, frutas. Fontes infinitas de alimento para a pança e a alma de formigas e humanos.


Ser formiga é bom. Detalhes do cotidiano são apaixonantes e nos moldam. Mas devemos sempre lembrar de montar em uma águia e nos distanciar da mesa. Ver o todo e repensar nossas preocupações. Saindo da mesa nos permitimos sair da caixa.

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Inteligência artificial para classificação de documentos

Hoje nossa equipe do MPRJ abriu o ciclo de palestras do Arquivo Nacional com apresentações sobre Inteligência artificial para classificação de documentos. Confira abaixo o vídeo na íntegra:

https://www.facebook.com/arquivonacionalbrasil/videos/642863892848960/?__xts__%5B0%5D=68.ARCBk75E1zVLiMZwiX0U1mnFklkOdceZhq8YW01HVSttZJ_pLR2pTxaGVDE5JS3wnVgzJ-CIENtk_xPqCwRz3QDL7T4Xy0t7c6fi23fqZuh7-ovc1Uq-15wacwRpBAR0WhekbAnC_0uDJV_kuTzxUUruCVTWX6oqCP5_vPNTzF_f5kApYdqwFskzaZXE6IeUhCQ3WG7Phscgr8kpeXNUf3f52_Gu33sg6IUdxOiNx9x4r60-mif2tG3PwRC6a8mi1g8yAf5S2pDNH6L8KrmVZpEPLJ9buuiBRiLv6EDfPE69VwuSHGnZgJozL8zbRgXCNYWL-wyckOsILiostwZWy9U4O8sDh1G9mhg&__tn__=H-R

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Ligações na madrugada

Uma vida sem ligações na madrugada não merece ser vivida. Como se mede o valor de uma pessoa se não pela quantidade de pessoas que ligarão nos seus melhores e piores momentos para compartilhá-los?


E não venha dizer que você tem amigos certinhos, tranquilos, que dormem às noves horas da noite e acordam para ver a alvorada! Esses seres estranhos também tem seus momentos insones, e até por sua falta de intimidade com a madrugada tendem a viver suas maiores loucuras e a ter seus piores pesadelos acordados noite adentro. E é nessa hora que se descobre o quanto uma pessoa vive dentro da outra. Na alegria ou na tristeza. Na sorte ou no azar. Na depressão ou no gozo.

Você me ligaria de madrugada?

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Monte Cervino


Eu sempre viajei o mundo através dos livros, dos filmes, da minha fértil imaginação. Nunca senti necessidade de me deslocar até um ponto do globo para saber como ele é. Sempre bastou fechar os olhos e pronto! Lá eu estava.


Mas então te conheci. Meio beatnik e meio hippie, com pitadas de trocentas outras referências não listáveis por um reles mortal. Você que jovem caiu na estrada, e me contou madrugadas afora sobre as delícias e decepções de viver na prática meus sonhos. Você que me instigou a desbravar rodovias rumo a uma pequena cidade no meio do nada. Sem certezas. Levando apenas uma mochila e um sorriso. 


Ali naquele estacionamento, depois de passar o dia como um andarilho sem rumo testando os melhores bancos da cidade para me encostar e ler Allen Ginsberg, quando meu olhar fitou o seu eu sabia que o caminho era sem volta, e que aquela cidade era uma mera escala em um caminho que seria criado ao caminhar.


Quanta energia pode caber em uma pessoa?!? Com certeza o suficiente para abastecer várias cidades. Pelotas, Cascavel, Pato Branco, Caiobá… nenhuma delas seria capaz de consumir tamanha energia que se expande para o universo e além.


Ter que voltar para casa foi angustiante. Eu tremia naquele ônibus assim que você foi embora da rodoviária. Inclusive desci e, eu que havia parado de fumar, pedi um cigarro ao motorista. Precisava me drogar para conter a ansiedade de estar me afastando daquelas tatuagem despretensiosas que me remetiam a Torres Garcia e abandonando toda a vida que você emanava. Mas nada como o tempo. E viajar de ônibus do Velho Oeste para a capital realmente nos dá muito tempo para pensar. Entre curvas e plantações de milho, escrevendo poesia ruim e lembrando os últimos dias, me toquei que não estava deixando você para trás, mas na verdade eu trazia comigo todo o vigor de uma vida vivida no mundo das coisas, e não no campo dos sonhos.


Mas a verdade é que depois daqueles dias eu nunca mais voltei para casa. Estive no mesmo lugar várias vezes, mas ele já não era o mesmo. Na verdade talvez até fosse, mas eu definitivamente não era. Passei a não caber mais em um quarto, um apartamento, um bairro, uma cidade, um país. O mundo, meu velho pequeno amigo que cabia em minha cabeça, de repente se revelou gigante, cheio de segredos e mistérios a serem descobertos in loco.


Alguns podem suspeitar da veracidade de uma jornada que começou no Portal do Céu (desculpe Seu Elias) ter rodado quatro continentes e, uma década depois, ainda ter a jovial capacidade de se apaixonar. Para esses eu tenho apenas um recado: noites frias tem cheiro de lasanha de strogonoff.

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Paixão platônica correspondida

Uma paixão platônica pode durar a vida inteira. Um amor construído em silêncio não tem falhas, atritos e nem sofre os desgastes normais de uma relação se a outra parte não fizer ideia de que é amada. Mas, o que será que acontece se por acaso a outra parte sentir o mesmo? Poderão duas pessoas se apaixonarem platonicamente uma pela outra ao mesmo tempo?


Por quanto tempo poderá resistir essa paixão? Como se sente um cortejador sendo cortejado por sua idealização? Poderão os sentimentos mútuos e mudos se encontrarem em alguma dimensão paralela e fomentarem uma aproximação terrena?  Ou poderá acontecer o contrário? Um apaixonado platônico ao ver que existe chance de reciprocidade, manterá sua chama? Consigo imaginar alguns românticos entrando em pânico nesta situação.


A paixão platônica correspondida é uma bomba relógio de dois tempos. A primeira explosão é aquela já cantada em prosa e verso, onde amantes vêem diante de um espelho sentimental seu objeto de desejo e se afogam em infinitos homônimos de prazer. Mas aqui quero tratar da segunda explosão. O choque de realidade. Essa barra inevitável que é a frustração de expectativas.


O maior dilema da paixão platônica correspondida é se confrontar com a outra pessoa de verdade. Afinal, você não se apaixonou pela pessoa, mas pela ideia que você mesmo criou à sua imagem e semelhança! Quão kafkaniano é conhecer alguém que tem a mesma aparência, voz e até nome de quem você está apaixonado, mas que na verdade é uma pessoa com vontades, vícios e virtudes diferentes de sua paixão?


Nenhum relacionamento a dois pode competir com um relacionamento criado apenas por um. E melhor, criado em um universo não sujeito às leis da física, da estatística, da psicologia e do tempo. Neste mundo idealizado, se algo não vai bem basta um pouco de imaginação para se viver o momento novamente, quantas vezes forem necessárias, até a perfeição ser atingida.


E quem irá se arriscar a perder uma paixão perfeita? Só um tolo! A melhor coisa que apaixonados platônicos correspondidos racionais podem fazer é fugir um do outro. Para bem longe! Para outra  cidade. Com um novo nome! Acabe com sua materialidade e viva no seguro mundo dos sonhos! E para o tolo que não seguir este conselho; saiba que sua paixão irremediavelmente irá acabar, dando  lugar a uma grande frustração. Ou a um grande amor.

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Fuga

Pessoas em fuga não são fugitivas. Não pelo menos no sentido metafórico mental em que nos referimos a alguém que não quer encarar seus problemas. Se mudar para outro lugar não é fuga. É coragem. É encontro. É vida. Fugir é ficar sentando no trono de um apartamento esperando a morte chegar. Fugir é achar que a vida não pode ser melhor do que já é. É achar que se tem muito a perder e não vale a pena arriscar.


Fugir parado é a forma mais eficiente de nunca mais ter que encarrar a vida de frente. A cada dia no  mesmo lugar se acumulam coisas, pessoas, sentimentos e poeira, que em grande volume torna árduo o trabalho de ser sacudida. O soterramento emocional é a forma mais eficiente de fuga! Lá no fundo do poço o fugitivo está escondido dos olhares recriminadores da sociedade que vai em frente e, com tanta coisa em cima de seus ombros, o fugitivo já nem consegue mais ver a luz que brilha fora do poço. 


Está aí! Este é o segredo de uma fuga. Ficar no mesmo lugar e se soterrar emocionalmente. Acumular tanta coisa sobre seus ombros até não ter mais forças para ver a luz que brilha fora do poço. Se alguém conseguir pensar em uma melhor receita para uma vida medíocre favor enviar carta para a redação que publicaremos a errata.


Se um dia eu disser que não posso ir com você, saiba que ai sim estarei fugindo. 

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